quinta-feira, 24 de março de 2011

Geração à Rasca? Mais geração rasca!




Boas.
Este post vai suscitar imensa rage, disso sei, mas muito sinceramente, tenho cara de quem se importa convosco? Aliás, é por merdas destas que simplesmente me deixei de importar. Não merecem o benefício da minha sabedoria.

Sei que venho tarde para a história do protesto da GAR, mas aqui venho, outra vez por um guest writer, Filipe Silva. Note-se que o dito post vem copy-pastado do e-mail que me foi enviado pelo guest writer, visto que tenho puta de vontade de perder tempo a editá-lo, ainda para mais que vocês até o conseguem ler assim. Cá vai.
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Um dia, isto tinha de acontecer.
Existe uma geração à rasca?
Existe mais do que uma! Certamente!
Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida.
Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações.
A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo.
Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.
Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor.
Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.
Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes.
Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego,... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou.
Foi então que os pais ficaram à rasca.
Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado.
Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais.
São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração.
São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!
A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas.
Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados.
Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.
Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere.
Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam.
Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras.
Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável.
Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada.
Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio.
Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração?
Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos!
Os jovens que detêm estas capacidades/características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós).
Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja! que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida.
E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!
Novos e velhos, todos estão à rasca.
Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens.
Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles.
A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar nem educar, nem fazer melhor, mas é uma culpa que morre solteira, porque é de todos, e a sociedade não consegue, não quer, não pode assumi-la.
Curiosamente, não é desta culpa maior que os jovens agora nos acusam. Haverá mais triste prova do nosso falhanço?
Pode ser que tudo isto não passe de alarmismo, de um exagero meu, de uma generalização injusta.
Pode ser que nada/ninguém seja assim.

2 comentários:

Anónimo disse...

Concordo com grande parte do que está escrito aí, nomeadamente no que toca à nossa situação actual não ser a de uma geração "à rasca" mas sim de todas elas, motivo pelo qual mais "torci o nariz" ao tema da manifestação quando anunciada. Não que não concordasse com os motivos porque protestavam, mas sim pelo facto de os "tomarem como pertencentes a esta geração".

Concordo também com o facto de estarmos perante uma geração "mimada" e "venenosa", habituada mais a "pisar o próximo" do que a pensar pela própria cabecinha e tentar construir o seu próprio futuro. Um bom exemplo disso é que vemos uma esmagadora maioria de pessoas desta geração a dizer que "este país vai de mal a pior", e no entanto dessas mesmas pessoas, apenas uma reduzida minoria considera emigrar e ir viver e trabalhar para fora. Reina a falta de coragem e o conformismo.

Porém, se concordo com tudo isto, devo dizer que não concordo com o "salto" desses factos para a conclusão de que os protestos que se dão são infundados e exagerados, e devo dizer que esse mesmo "salto" é falacioso. O "salto" que vemos aqui é o segunte:

Premissa 1 - Esta geração é uma geração mimada.
Premissa 2 - Esta geração está a dizer que a situação do país é intolerável
Conclusão - A situação do país estar intolerável é um "mito" desta geração mimada.

Lembro que pelo facto desta geração ter graves defeitos e de estar mal habituada, não há qualquer relação de todo entre esse facto e a questão de a situação em Portugal estar excessivamente má ou não. Isso é uma falácia conhecida como "Argumentum ad hominem" em que se tenta justificar um argumento apelando à ridicularização do autor.

A verdade é que, apesar de não estarmos perante a geração mais exemplar deste mundo, e apesar dos problemas políticos, sociais e económicos em Portugal estarem a afectar todas as gerações e não uma só, os problemas referidos são inteiramente verdadeiros, e revelam uma situação preocupante pela qual o nosso país está a passar.
Dou o exemplo da Alemanha, um país onde à excepção dos transportes públicos o custo de vida é pouco mais caro que em Portugal, uma pessoa ganha cerca de 1500€/mês por trabalhar num bar.
Dou o exemplo dos próprios espanhóis até, cujo custo de vida também não difere muito do nosso (é um pouco mais caro em algumas coisas e um pouco mais barato em outras), e exemplo do qual soube uma interessante curiosidade recentemente, neste caso a nível académico. Apesar de não ter conhecimento do valor das bolsas académicas em Espanha, tenho conhecimento que a bolsa de Erasmus de um estudante espanhol que venha para Portugal anda pelos 1000€/mês, enquanto a de um português que vá para Espanha anda em cerca de 240€/mês. É uma diferença de 4 vezes mais!!!

(Segunda metade em baixo)

Anónimo disse...

(continuação)

O mesmo se aplica à outra questão, a das oportunidades de emprego, que também esta é uma questão local mas sim geral, mas também neste campo os restantes países europeus não conseguem atingir os nossos níveis absurdos, e muitas das vezes a escolha do português acaba por se reduzir ao "ficar no desemprego ou emigrar". É verdade, como foi dito, que muitas vezes é preciso "começar por baixo", que uma pessoa antes de realmente arranjar um emprego na sua área pode ter que se sujeitar a trabalhar num McDonald's ou num Continente (o que é a situação de muito licenciado em Portugal hoje em dia), mas não deixa de ser triste quando em grande parte das vezes olhamos para essas mesmas pessoas, com essas mesmas qualificações e verificamos que "no país x ela teria tido lugar". Aí temos de começar a pensar duas vezes acerca da nossa situação ser "normal" e "aceitável" ou não.

É verdade que esta geração está a ter uma atitude megalómana, como se todos os males do mundo lhes tivessem caído em cima, quando todo o país atravessa uma situação sufocante. É verdade que somos um povo "mesquinho" mais habituado a "subir pisando o vizinho" do que a criar a sua vida de maneira honesta, ética e compreensiva. É também verdade que enquanto estes problemas não estiverem ultrapassados vai ser extremamente difícil conseguir mudar muita da situação vivida no nosso país.

Mas... é também verdade que vivemos num país onde o povo é bastante sufocado e explorado em relação aos restantes em padrões europeus, que vivemos num país corrupto e impunemente mafioso, onde os deputados são aumentados em 125 ou 200% (já não me lembro qual das duas) enquanto o "povo" não vê aumentos há anos e continua a receber reduções e cortes, onde os impostos sobre o povo aumentam enquanto os impostos nos desportos de luxo são "deixados em paz", onde somos o país com mais deputados na Europa inteira, apesar do tamanho e desenvolvimento do mesmo ser dos mais baixos em relação a esta. E damos por nós numa situação onde as condições de vida e sustento do português comum se revelam bastante inferiores em relação ao resto da Europa acima de tudo pela mesquinhez, desonestidade e incoerência dos "grandes tubarões".

Sim, a maneira megalómana e egocêntrica como esta geração decidiu abordar o problema é triste, sem dúvida, mas não deixa de ser triste também a maneira como efectivamente a podridão que reina no nosso país neste preciso momento ser apesar disso, bastante real.